sexta-feira, 25 de junho de 2010

Futebol (&) Arte?

Ele não gostava de futebol. Ele não gostava de arte. Tinha um time pelo qual simpatizava, mas a existência de tal esporte nunca foi uma prioridade. Não mesmo.

Então, um dia, ele foi assistir um jogo. No estádio. Um dia, um livro chamou sua atenção. Uma coletânea de poemas. Uma pintura prendeu sua atenção por vários minutos. Um Bosch. Ele não queria ir, mas seu tio não pode e ele foi fazer companhia para sua prima. Ele não queria ler aquele livro, mas algo nas páginas amareladas pelo tempo chamou sua atenção. Ele achava a pintura, de certa forma, nojenta, mas até se inclinou mais para perceber os detalhes.

Então ele começou a gostar de futebol. E de arte. Bilac foi apenas o ponto de partida. Depois veio Cecília Meireles, Castro Alves, Drummond. Depois de Bosch veio Picasso, Monet, Dali, Matisse. Depois do estádio veio a torcida, a camisa, a bandeira, a Copa do Mundo.

Mas ele nunca entendeu quando alguém lhe falava de futebol arte. E nunca soube explicar o que era, quando era perguntado. E quando ele lia sobre os jogos, encontrava montes de números, frios, que lhe contavam a partida como algo corriqueiro. E isso tirava a possível arte do futebol. E os comentaristas interesseiros também. Ele procurava e não encontrava.



Um dia ele viajou para a Argentina. Como bom brasileiro, ele não gostava da Argentina. Como bom amante do futebol, ele adorava a Argentina. E ele viu uma propaganda. Mesmo com seu péssimo espanhol, entendeu uma parte que falava algo como "malditos os que jogam sem poesia".

Então ele voltou ao estádio. E ele percebeu.




Percebeu como tudo era harmonioso. Percebeu a sinfonia dos milhares de pés andando na mesma direção em um domingo qualquer. Percebeu como aquilo era a válvula de escape de milhares de pessoas que enfrentava, todos os dias, os problemas comuns a todos nós.

Percebeu a ópera formada por mais de 15 mil vozes diferentes e iguais, o pensamento direcionado ao mesmo ponto, às vezes próximo, às vezes impossível de ser alcançado.

Percebeu os movimentos perfeitos, ensaiados por uma coreografia de torcida, espontâneos na comemoração de gol ou tão espontâneos que chegam a parecer ensaiados, as mãos na cabeça quando a bola não entra, a expressão de incredulidade marcada em todos os rostos. Como aqueles traços marcantes fariam inveja a Michelangelo, fazendo seu David parecer brincadeira.


Mas também percebeu a alegria. Alegria no rosto de jovens e velhos, de homens e mulheres, de irmãos e estranhos. Percebeu a alegria do jogador, a alegria do torcedor. Percebeu cada sorriso sincero e cada abraço apertado. Percebeu o gesto discreto pedindo o passe, a expressão de dor da lesão que se mostra presente no momento da arrancada. E a tristeza das cores adversárias no momento do jogo perdido. Luz e sombra. Alegria e tristeza. Céu e inferno separados por um milésimo de segundo, de um monte que os mestres barrocos não conseguiram separar. Ou unir.

Percebeu que somos iguais.


Percebeu o olhar do artilheiro. Percebeu o silêncio que precede o grito. A bola dominada no peito e chutada com força, que caprichosamente não entra. O repórter que busca a fotografia. O momento do gol. Tão perfeito quanto o sorriso da Monalisa. O goleiro que se estica como um dançarino, mesmo sabendo que nunca chegará a tempo. Ou chegará? A mulhara intransponível que Gengis Khan não seria capaz de vencer.



Mas um drible plasticamente perfeito seria. Aquela harmonia que Bilac buscava. Só que sem as palavras. E quem precisa delas? Existem poetas e existem poetas. Poetas que alcançam as estrelas e poetas que nos fazem parar no tempo apenas para admirar toda a sua classe no tapete verde. Poetas que colocam riso em nossas faces. E outros que nos fazem sofrer a perda de seus amores.



Não só percebeu, mas lembrou como a arte é revolucionária. Como ela é capaz de trazer o orgulho de uma nação esquecida. Ou mesmo de criar esse orgulho. Percebeu como ela é inconstante e nem sempre justa. Como o trabalho mais bem feito pode nem sempre alcançar aquilo que é seu de direito. E também como o futebol tem muito disso. Ah, como tem. E nos faz esperar, ano após ano, para que nossos anseios se tornem reais. Pode ser que eles nunca sejam. Mais romântico impossível.


E eles se tornam reais. E reis. Finalmente temos nossa amada em nossos braços. Toda uma história contada por uma imagem, por uma lembrança. É surreal, é real, é romântico. Ao mesmo tempo. Está na história e está fora da história. Seus netos conheceriam aqueles gênios, muitos anos depois. Separados por séculos, talvez. Mas juntos. Atemporal. O futebol e a arte. Futebol e arte. Futebol é arte.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Hoje eu falei com Deus

Sabe quando você está atrasado e o ônibus quebra? Foi o que aconteceu comigo naquele dia. Nunca estive em um ônibus que quebrou no meio do caminho, mas aquele dia foi diferente.

Todas as pessoas saíram e fizeram fila, esperando para embarcar no próximo ônibus, que viria nos recolher. Eu não. Olhei em volta e só então percebi onde eu estava.

Dei as costas ao ônibus e comecei a voltar. Subi aquele final (ou seria o começo?) da Rua XV sem pressa. Fiz a volta, subi no viaduto e parei na Praça das Nações.

Aquele é um dos meus lugares preferidos na cidade. Arrumei o cachecol e as incontáveis blusas que eu vestia para me prometeger daquele costumeiro frio que passa por Curitiba em um dia qualquer de Julho.

Não deveria ser mais que 7 horas da manhã. Respirei fundo. A caixa de água ao meu lado parecia também olhar a cidade. Vi a Rua XV indo embora, até ficar difícil enxergá-la no meio daqueles muitos prédios. Vi o Couto Pereira, outro lugar preferido da cidade, longe, um gigante verde no meio daquele mar cinzento de prédios que se confundia com o céu sem sol que nos acompanha na maior parte do ano.

Sentei. Respirei fundo. Senti o ar frio no meu rosto. Arrumei o cachecol de volta. Soprava um vento tranquilo, embora gelado.

- É uma bela vista, não é?

Olhei para o lado, assustado. Ali estava um rapaz muito magro, um pouco mais alto do que eu. Ele também estava cheio de casacos. Me olhava sorrindo. Olhos muito escuros, qualquer um poderia confundi-los com cavernas. Mas não eram assustadores, eram alegres. O cabelo comprido, todo despenteado, levantava com o vento. Tinha as mãos nos bolsos e esperava uma resposta minha.

- Sim, é. Até me faz esquecer dos meus problemas.

- Ah, humanos, sempre reclamando dos problemas!

Ele sorriu e sentou ao meu lado.

- Não vejo você muito por aqui.

- Adoro esse lugar - respondi - mas realmente, faz tempo que não paro aqui para apreciar essa bela cidade.

- Deveria fazer isso mais vezes. Particularmente, adoro essa coisa de cidades e tal. É incrível ver como homem pode construir, destruir, mudar... embora nem sempre para melhor, mas enfim. É lindo, mesmo. Não entra na minha cabeça que olhar para essa mesma direção, desse mesmo ponto, já nos mostrou paisagens diferentes, um dia...

Olhei para ele, intrigado. "Que cara esquisito!". Ele olhava para longe. Parecia estar muito longe dali.

- ...mesmo que eu tenha criado tudo isso.

Agora sim eu achava ele realmente esquisito.

- Desculpe, acho que não ouvi direito.

- Ouviu sim, guri. Mesmo que você escute Metallica no último volume, isso não vai afetar sua audição. Quando eu tava desenhando você, fiz com ouvidos resistentes.

Epa, como esse cara sabia que eu gostava de Metallica? Esse era o mistério, afinal, Metallica É para se ouvir no último volume. E que história é essa de me desenhar?

- Calma aí, cê tá falando que é Deus ou algo assim?

- Mais ou menos por aí.

- Tomou seu remédio hoje?

Isso saiu da minha boca sem pensar. Normalmente falo isso para meus amigos, quando eles começam a pirar muito em certo assunto, mas não pra um estranho, que poderia muito bem estar armado e com péssimo humor. Mas ele riu.

- Ah, bem que eu queria que essas coisas aí fizessem efeito em mim. Sabe como é, esse lance de estar em todo lugar meio que me livra de dores corporais, a princípio, mas eu tô aqui, sabe, acabo tendo uma coisinha ou outra no sentido psicológico. Só que como não tenho um corpo... ah, você não tá acreditando. Olha só. Quando você tinha 12 anos e brigou com sua catequista, porque ela disse que você não deveria fazer um monte de coisas porque iria irritar Deus, e você respondeu que Deus deveria ser um cara legal, e que por isso ele deveria estar bem de boa com o que você fizesse, eu digo que você tinha razão. Se eu dei uma coisa chamada livre arbítrio pra vocês, é porque eu quero que vocês façam o que quiserem, e isso é problema de vocês. Aliás, isso de "Deus ser um cara legal" me agradou muito. Melhor do que aquela imagem de vingativo que passam de mim por aí, ou aqueles trouxas que ficam dizendo que eu sou Eric Clapton. Ah, que que é isso, se eu fosse aparecer aqui como guitarrista, eu seria o Tom Morello.

Ok, ele saber o que eu tinha respondido para a catequista era explicável mas, ainda assim, assustador. Não mais do que o que ele falou bater exatamente com a idéia que eu tenho de Deus. E pior: ele preferia Tom Morello a Eric Clapton. Aí eu tive que concordar com ele.

- Sabe que você me convenceu? Ou não, às vezes é só meu cérebro que tá funcionando devagar pelo horário, ou eu tô tendo alucinações e tal...

- Alucinações você não vai ter até os 70, isso eu garanto. E nem vem que o cérebro funciona melhor de manhã, só que ninguém descobriu isso ainda.

- Ok, você me convenceu.

Ele sorriu.

- Mas esse lugar é realmente bonito.

- Posso perguntar uma coisa?

- Claro.

- Por que eu?

- Você é um cara legal. Eu gosto de caras legais. Você é curitibano, eu gosto de curitibanos. Exagerei um pouco quando fui dosar o orgulho de vocês, é verdade, mas fazer o que. Acabei de distraindo um pouco. Mas acho que é por isso que ainda temos umas vistas legais daqui. Aliás, achei muito legal essa coisa dos pinhões nas calçadas que vocês fizeram.

Eu ri, nervoso. Ficamos em silêncio. Ele respirou fundo e levantou.

- Bem, preciso ir. Até qualquer hora, guri.

Ele começou a se afastar. Já estava meio longe quando eu tomei coragem.

- Ei, posso perguntar uma coisa?

Ele parou, olhou de volta e sorriu. Voltou para o meu lado, esperando a pergunta.

- É verdade que o diabo é o pai do rock?

Ele gargalhou.

- Você tem a chance falar com Deus, de perguntar o que você quiser, qualquer coisa nesse mundo e é isso que você quer saber? Falei que você é um cara legal! Enfim, vamos colocar as coisas desse modo. Quando eu criei o Pink Floyd, ele criou o Yes. Quando eu criei o Black Sabbath, ele criou o Twisted Sister. Quando criei o Joy Division, ele criou Legião Urbana. Quando criei Neil Young, ele criou Bob Dylan, sacou?

- Então ele só avacalha? E sério que o Dylan é a parte avacalhada?

Ele sorriu.

- Sério que você que fez o Sabbath?

- Ah cara, eu adoro o Sabbath. Adoro Zeppelin, adoro Who. Adoro Creedence. Taí outra coisa que me deixa triste. Minhas melhores criações não são creditadas a mim.

Ele fez cara de chateado mas riu em seguida.

- Não quer saber mais nada? De onde viemos, pra onde vamos, se existe vida após a morte, qual religião é a certa, o segredo da vida, do universo e tudo o mais nem nada disso?

- Ah, isso aí eu acho que vou acabar descobrindo uma hora ou outra.

Ele sorriu novamente.

- Bem, agora eu preciso ir mesmo. Até qualquer dia desses.

Ele se afastou. Eu não fiquei olhando ele ir, voltei a olhar a cidade.

- Ah, mais uma coisa - gritou ele lá de longe. Eu virei a cabeça para olhá-lo. - She loves you, yeah, yeah.

Ele sorriu, fez a curva e foi embora. Eu olhei pra cidade novamente. Sorrindo.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Tempos Modernos ou Quando a Pulseira Arrebentou.

Tinha esse amigo. E esse amigo tinha um relógio. Um curioso relógio. Eu também tinha um relógio. A minha namorada, irmã dele, também tinha um. A namorada dele também tinha. O meu irmão também. Mas nenhum era igual o dele.

Lembro que, quando eu o conheci, há muito tempo atrás em uma galáxia muito distante, ele já usava relógio. Eu não. Aprendi com ele. Relógio vicia, sério. Depois que eu comecei a usar, não parei mais. E influenciei outras pessoas, também.

O curioso é que depois que a gente começa a usar relógio, parece que o tempo já não é o bastante. Primeiro paramos de brincar com os carrinhos porque precisamos ir pra escola. Então temos que abrir mão das partidas de futebol com o time da outra rua pra fazer a lição. Depois precisamos trabalhar. E o tempo vai ficando cada vez mais curto.

Mas não pra esse amigo. Não para o relógio dele. Era um relógio curioso. Era um amigo curioso. Ele sempre tinha tempo pra tudo. Conseguia se organizar de um jeito invejável. Seria, o grande segredo dele, uma agenda? Provável, mas não. O segredo era o relógio.

Ah, o relógio. Era um relógio curioso. Ele nunca dava as horas exatas. Era sempre "seis e alguma coisa" ou "alguns minutos para às 11". Me irritei com ele, várias vezes. Ao estar atrasado para um compromisso, perguntava as horas e ele dizia "Ah, são quatro e pouco". Nunca sabia quanto era o pouco. Poderia ser 16:07, ou 16:26 ou até 16:59. Mas ele não estava errado. Era "quatro e pouco". Engraçado que eu sempre chegava na hora, se perguntasse as horas para ele.

Engraçado, também, o jeito que ele tratava as horas. Sempre de relógio mas, de algum modo, o tempo para ele era como um belo prato de merda. Trinta minutos? Bah, que nada. Daqui a pouco passa. Ah, pra que querer três dias pra montar um trabalho? Esse descaso era incrível.

Então um dia eu perguntei pra ele porquê ele nunca se atrasava pra nada. Ele disse que não se preocupava com o horário. Partia quando achava que deveria partir. Afinal, horas são medidas estúpidas criadas pelo homem. Ele poderia fazer as próprias horas. A hora que ele chegasse no trabalho era a hora de trabalhar.

Então eu parei de usar relógio.

No dia seguinte, fui demitido por chegar atrasado.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Essa noite, eu tive um sonho de sonhador.

Não, não sonhei com O Dia Em Que a Terra Parou. E nem é aquele sonho em que eu leio uma resenha que diz que meu álbum é tão foda quanto qualquer álbum dos Pixies. É só o sonho mais drogado que eu já tive em toda a minha vida, e como eu ando sem nada pra escrever, vai ele mesmo.

Tudo começa comigo indo pra escola. Aqui muitos podem dizer que foi um pesadelo, não um sonho, mas não chega a ser pesadelo porque eu nem chego na escola.

Beleza, tudo normal. Tirando a parte que eu fui andando pra escola.

Muitos podem não entender, então vou explicar. Minha escola fica razoavelmente longe da minha casa. O lance é que o caminho de casa pra escola é basicamente uma rua. Passando perto da minha casa, é uma avenida que corta uns dois bairros da cidade. Daí ela faz uma curva e muda de nome, e corta mais uns dois bairros. Daí desce um morro, muda de nome de novo, e corta mais um bairro. O ônibus que eu pego três vezes por semana às 12:20 passa por ela toda, e ele faz isso em uns 20 minutos. Mas, se eu fizer o mesmo caminho a pé, o buraco é mais embaixo.

Enfim. A loucura começa aí. A troco de que eu iria para a escola a pé, pelo menos se eu quisesse chegar no horário. E a pior parte é que tinha um monte de gente junto comigo, mas muita gente, e de todos eles eu só conhecia três pessoas. Vou dar seus nomes, Léo, Japa e Gabriel.

Para efeito de movimento estudantil, todo o bolo estava com o uniforme da escola. Beleza, começamos a andar. Durante o caminho, o Japa estava se comportando de uma maneira estranha. Ok, quem o conhece sabe que o seu modo de agir não é lá muito normal (livro no Passeio Público que o diga, mas isso eu conto outra hora), mas ele estava excessivamente estranho. Parecia que, em cinco minutos, tinha usado mais drogas do que o Syd Barrett, o Jefferson Airplane, os Doors e o Love já usaram em toda a história.

Andamos bem pouco, e antes da primeira mudança de nome da rua, começou a chover. Todo mundo saiu correndo, cada um pra um lado, e o pior é que a chuva nem era tão forte. Esse povinho de açúcar, vou te contar...

Beleza. Eu corri igual um desesperado e cheguei em um terminal. A beleza da coisa é que pra chegar em um terminal eu teria que andar muito mais do que pra chegar em um lugar pra me esconder da chuva, mas quem disse que sonho precisa fazer sentido, né. Nesse terminal, junto comigo, havia uma menina que estava no grupo.

Meu canário belga, a guria era tão linda que chegava a ser feia. Beleza, eu não sabia quem era, mas vamos conversar, né.

Ok, eu fui conversar com ela e a menina era bem simpática. Fomos até um ponto do terminal e sentamos pra esperar o ônibus. Tá que a gente entrou no terminal sem pagar, mas enfim. Outra coisa bizarro era o ponto. Quem conhece as estações tubo de Curitiba sabe que já não são as coisas mais normais do mundo (basicamente é um tubo que você entra pra esperar o ônibus), e esse ponto no terminal era como o tubo, mas ele não estava deitado. Estava em pé. Estava mais pra parada de ônibus espacial.

Dentro do tubo havia um relógio e um banco, e atrás do banco tinha grama. Nós sentamos ali e continuamos conversando, até que ela disse "Ei, quer ver o que deixou o Japa maluco daquele jeito?". Eu disse "Sim", ela puxou um desodorante da mala e espirrou no meu rosto.

Eu comecei a delirar na hora. Nunca usei drogas e acho isso a coisa mais retardada do mundo, e o mais próximo que eu chego dessas viagens é ouvir Pink Floyd, mas acredito que mesmo que eu fosse o cara mais chapado do mundo, não saberia descrever como é se drogar em um sonho drogado.

Enfim, eu senti a menina pegando no meu braço e ouvi uma voz lá longe dizendo "Rodrigo, o ônibus chegou". Nós embarcamos e dentro dele estava o Léo. Ele disse "Ei, a gente precisa achar o Gabriel", e a menina respondeu "Esse ônibus aqui passa no Largo da Ordem, talvez a gente encontre ele lá". Então o ônibus saiu e a gente chegou no Largo da Ordem.

Ainda chovia, mais ou menos na mesma intensidade do começo do sonho. O problema é que existe a "estação Largo da Ordem. Ao embarcar no Ligeirinho, aguarde sempre o desembarque", só que não tinha nada haver com a estação Largo da Ordem real. Primeiro que o tubo estava bem na frente da Igreja, lá onde os carros não passam. Então aí está uma. A outra é que aquele não era o Largo da Ordem. Quer dizer, ser ele até era, afinal, estava todo mundo dizendo que era o Largo da Ordem, mas estava bem diferente do que eu me lembrava. Enfim.

O Gabriel estava lá. Nós chegamos perto dele pra falar e ele disse "É melhor a gente ir rápido, ou vamos nos atrasar". Então o sonho mudou.

Estava eu e meu primo andando em uma rua. Não sei dizer se o primo em questão é o Léo ou o Júnior, que não apareceu nessa história até o presente momento, porquê em determinado momento ele era o Júnior, e em outro momento era o Léo. De qualquer forma, a rua eu reconheci na hora, ela fica em São Mateus do Sul. Era uma subida, e o tempo estava frio, cheio de nuvens e tal. Estávamos subindo essa rua, e então eu me toquei que era um dos caminhos que eu poderia pegar para chegar na escola que eu frequentava na época que morei em São Mateus do Sul. O problema é que eu estava com o uniforme da atual escola.

Mas daí eu me toquei que eu não estava indo lá estudar, só visitar. Beleza, quando eu cheguei na escola, do outro lado da rua, estava um bando de gente. Nesse momento, o meu primo, que era o Júnior, disse "Aí estão eles, Rodrigues" (não, meu sobrenome não é Rodrigues, ele é o único que me chama assim), e eu fui até o bando de gente. Reconheci muitos ex-colegas que estudaram comigo naquela escola, pouquissímos dos quais ainda mantenho um quase inexistente contato.

A pior parte é que de todas as pessoas que estavam ali, desde a menina por que eu tinha uma (grande) queda, até os caras que eu odiava, até as pessoas com quem eu nunca falei e alguns amigos que fiz, o melhor amigo que eu tinha na época não estava. Foi meio triste não encontrá-lo lá.

Então eu entro na sala com eles. O bizarro é que eu sei que a maioria nem estuda mais naquela escola, alguns reprovaram de ano e outros eu não faço a mínima idéia de que fim levou. Entramos na sala e eu assisti as aulas com eles. Depois fui embora.

No caminho de volta, meu primo, dessa vez o Léo, e eu andamos tranquilamente, ainda em São Mateus, pegando um dos vários caminhos possíveis pra voltar pra casa em que eu morava lá. (o legal era que a minha casa ficava em uma parte baixa da cidade, e a escola ficava na parte mais alta. Teve uma época em que eu ia de bicicleta pra escola, e na hora da volta me largava naquelas descidas e quase era atropelado três vezes por dia).

Estávamos a pé. Acho que é porque nos últimos meses que fiquei lá eu vendi minha bicicleta, mas também pode ser que é pelo Léo não saber andar de bicicleta, então seria bizarro. Tá, mais uma anormalidade não faria mal, mas sei lá. De qualquer modo, estávamos a pé. Em determinado momento ele saiu correndo na frente. Eu pensei "Que cara idiota, ele não conhece a cidade. Vai correr pra quê?". Daí eu ouvi um "Rodrigo!" e o rosto do meu pai apareceu na minha frente.

Ele estava indo pra trabalho e precisava me deixar acordado, pra não perder a hora.

sexta-feira, 3 de novembro de 2006

Diário.

Diário feio, bobo e inanimado.

Nem sei porque vou te contar isso. Você é muito fofoqueiro e vai espalhar pra todo mundo, como se eu tivesse colocado na Internet.

Meu dia foi péssimo. Tudo começou ontem, quando eu fui no cabeleleiro e ele deixou meu cabelo horrível. Estou parecendo um espantalho, aposto que ele nem vai olhar pra mim.

Depois tive que ir pra escola. A vaca da professora está implicando comigo sempre, desde que eu falei que ela era uma sonsa. Também, ela tomou meu mp3 que estava cheio de músicas do RBD. Tive vontade de pular no pescoço dela, mas achei melhor me controlar.

Depois tive que voltar pra casa. Odeio ela. Queria tanto ser uma Pussycat Doll, mas nasci nessa bosta de país sub-desenvolvido e tenho que aguentar meu pai ouvindo Beatles o dia inteiro.

Daí me tranquei no quarto e entrei no Orkut. Então, Diário, fui ver se tinha alguma vadia no scrapbook dele e vi que ele apagou todos! Isso é suspeito, deve ter alguém.

Peguei meu mp3 e joguei na parede porque não queria pegar sujeira daquela vaca de professora. Meu celular tocou, aquela música maravilhosa! do Westlife. Atendi era a Má, ela queria me convidar pra ver filme.

Eu fui até a casa dela e nós fomos até a locadora. Ela está muito estranha ultimamente, acho que ela é lésbica e está dando em cima de mim. Enfim, eu escolhi Confissões de uma Adolescente em Crise. Lindsay linda como sempre!

A Má pegou um tal de Laranja Mecânica. Achei horrível, um filme sem sentido nenhum! Depois que assistimos na casa dela eu tive que voltar pra casa.

Quando eu voltei pra casa eu entrei direto no Bd e fiquei lá, fotolog, Orkut...

Então o Pc deu pau e eu perdi todos as minhas músicas! Tchau West, PCD, Britney... perdi todos!

Juro que se os professores não deixarem eu ficar dormindo nas aulas de segunda, eu arranco a cabeça de um!

Tchau, Diário inanimado.

quinta-feira, 12 de outubro de 2006

12 de outubro.

Qual foi a criança que não ficou puta com seus pais nessa data?
Certamente que não fui eu.

É sério. Desde que me entendo por gente, lembro dos dias Da Criança que passei, e não foram só esses. Podem ser incluídos Natal e Aniversário. Incluídos no quê? Nos dias em que sempre fiquei puto.

Puto com o quê? Porra, pára de fingir que nunca foi criança, e em um dos poucos dias em que você espera anciosamente, aguarda como se fosse perdê-lo a cada noite, esperando o novo Super-Ultra-Mega-Power-High-Boneco-Articulado-Do-Batman-Com-Batmóvel, acorda nessa manhã, encontra aquela sua tia esquisitona que sempre falou coisas estranhas na sua presença e ganha... uma camiseta dez números menor que o que você veste. E a desculpa é aquela "Ah, mas você cresceu tanto..."

É chato isso.

É claro que você sempre teve mais tralhas do que o necessário no seu quarto, mas pô, a indústria voltada para os produtos infantis sempre lança algo totalmente revolucionário a cada semana, e se algum amigo conseguir o Super-Ultra-Mega-Power-High-Boneco-Articulado-Do-Batman-Com-Batmóvel dois minutos antes de você, você é um fracassado.

Isso não tem preço. Você vai passar dois dias, dois dias!, com um boneco, tempo suficiente para zoar seus colegas que não o possuem. Mas, como eles são putamente invejosos, vão comprar o mesmo boneco. Daí você tem que esperar o próximo Aniversário/Natal/Dia das Crianças para ter o novo modelo, que voa e faz exorcismos. Sua esperança está em cada centímetro de papel de embrulho vermelho caído ao chão, em que cada caixa revela apenas roupas, roupas e mais roupas.

Seu sonho está quase no chão, quando chega o seu Padrinho. O único que entende sua necessidade de se provar diante seus colegas. É aquele que lhe dá dinheiro e diz "Você já bastante crescido, então é melhor comprar o que achar melhor". Um sorriso brilha em seu rosto, mas é feriado, e você não pode sair para comprar o Super-Ultra-Mega-Power-High-Boneco-Articulado-Do-Batman-Com-Batmóvel na mesma hora.

Você precisa esperar. E é essa espera o tempo fatal. No dia seguinte, sua mãe agarra seu braço e leva você até uma loja, onde compra... mais roupas.

Ignorando todos os lamentos, todas os argumentos que você conseguiu pensar em menos tempo, e transforma o Super-Ultra-Mega-Power-High-Boneco-Articulado-Do-Batman-Com-Batmóvel em uma jaqueta que lembra um tecido usado para fazer guarda-chuvas. A pior parte é se ela enfia você dentro daquilo e manda pra escola.

Então, quado todas as suas esperanças já foram pro ralo, você encontra seus amigos, e vê que todos eles estão com jaquetas semelhantes e seus derivados. Nenhum deles conseguiu o Super-Ultra-Mega-Power-High-Boneco-Articulado-Do-Batman-Com-Batmóvel. É nessa hora que você fica puto com eles, porque todos eles decidiram comprar uma jaqueta igual a sua.

Hunf, essas crianças invejosas...

domingo, 24 de setembro de 2006

E que Murphy esteja com você.

Não estou querendo ser pessimista, mas foi isso que aconteceu comigo na quarta-feira.

Só para dar uma introdução, aqui em Curitiba está um estado preocupante sobre a falta de água. Ou seja, já fazia alguns dias que não chovia. O problema foi que a merda do tempo resolveu desencantar na manhã do dia 20.

Isso é bom em vários aspectos. Porém, como sempre há um porém, nem tudo foi perfeito. Como o já citado Murphy fica atacado em alguns dias, e eu acho que aquela quarta-feira foi um deles, começou a chover antes de eu sair paras ir até a escola.

Uma chuva fraca que, porém novamente, aumentou durante a manhã. O curioso foi que ela aumentava e, logo em seguida, ficava fraca novamente. Às 11:50 horas bateu o sinal e eu me preparei para voltar para casa, como se estivesse me preparando para ir pra guerra. Segurei minha bazuca... digo, meu guarda-chuva e saí belo e formoso pelas ruas do bairro, em direção a minha casa.

Não sei como, mas por quase metade do caminho, eu fui normalmente, quase sem me molhar.

Já estava confiante de que iria chegar em casa apenas com os pés e a barra da calça molhados. Doce engano.
No caminho da escola pra minha casa, há uma reta e, após ela, um morro. Minha casa fica relativamente próxima a escola. Estava na citada reta quando vejo um carro surgir de sabe-se-lá-onde. Eu olhei para baixo. Havia uma grande poça de água entre o meio fio e a rua. Olhei para o motorista. Ele falou algo para o passageiro, apontando para mim. Ambos riram.

"Por mais filho da puta que o cara seja, ele não faria isso", pensei. Mas, para garantir, acelerei o passo, visando sair de perto da poça de água. Logicamente o carro foi mais rápido.

Quem adivinhar o que aconteceu ganha um pirulito.

Sim, o carro passou sobre a poça e eu, na tentativa de salvar meu material de escola, me virei e tentai me proteger com o guarda chuva. Claro que minha calça e um pedaço da jaqueta saíram feridos. Um grito de "Filho de uma égua!" escapou da minha boa. A chuva estava mais forte do que nunca mas eu, que já estava mais puto que todos os cabarés de Paris juntos, larguei o guarda-chuva, peguei a maior pedra que havia próxima aos meus pés, me virei e joguei.

Quem adivinhar o que aconteceu ganha um saco de amendoim.

Na minha cabeça, o carro já staria longe e eu não teria força para fazer a pedra chegar até ele. Doce, mas muito doce, engano. Ele precisou reduzir para passar uma lombada na rua, e a pedra pegou exatamente no meio do vidro traseiro dele.

Fiquei parado por pouco mais de dois segundos para entender o que havia acontecido. Quando ouvi aquele barulho de vidro rachando, virei as costas e saí correndo. Agora, lembram do já citado morro? Então, pra subir ele no gás, com aquela chuva foi a coisa mais estranha que eu já fiz, o que inclui ler a letra "aportuguesada" de Perfect ouvindo Shine On You Crazy Diamond.

Pra minha sorte, não sei se o cara desistiu de me seguir ou simplesmente pensou "Bom, se eu não tivesse feito isso, ele não teria feito isso."

Pelo menos esse cara nunca mais vai querer molhar estudantes em dia de chuva.
Boa tarde.